segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012
POLITICALHAS QUE MATAM
Governos, qualquer um, a qualquer tempo, em qualquer nível de poder, deveriam tratar a Saúde pública a partir de um pressuposto real: o mau gerenciamento nesse setor pode ser fatal, vital, letal.
Políticas públicas equivocadas e recursos mal aplicados - seja por desídia, negligência ou mesmo em decorrência de desbragadas corrupções - acabam matando as pessoas. Isso é fato.
Há cerca de dez dias, um fato revelou incongruências e politicalhas - ou politicagens - verdadeiramente letais no setor de Saúde pública.
Um garoto de 13 anos de idade morreu na UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) de um hospital de Brasília. Era filho de Flávio Dino (PCdoB), ex-deputado federal, juiz federal por 12 anos e atual presidente do Instituto Brasileiro do Turismo (Embratur).
A suspeita de negligência e de erro médico está sendo investigada pela polícia, pelo Ministério Público e pelo Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal.
Durante o sepultamento, estava presente, entre outras autoridades, Agnelo Queiroz, ex- PCdoB, governador do Distrito Federal eleito pelo PT. Além dele, pelo menos mais 200 pessoas, entre elas alguns condestáveis da República, como o vice-presidente Michel Temer, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
'Quando há esquema político na área da Saúde, não se resolvem os problemas e as pessoas morrem', disse na frente de todo mundo Flávio Dino - não o ex-magistrado, não o político, mas o pai.
'Não é possível alguém morrer de asma dentro de uma UTI, Agnelo. Esse hospital [de Brasília] matou meu filho. Por que não me mataram? Eu preferia mil vezes estar naquele caixão no lugar dele', disse Flávio Dino.
Segurando o governador Agnelo Queiroz pelo braço, continuou: 'Vou enterrar meu filho sem saber direito por que ele morreu. Você sabia que a necropsia do corpo não foi completa porque tem equipamentos quebrados no Instituto Médico Legal?', questionou Flávio Dino. O governador, que calado estava, calado ouviu a pegunta e calado permaneceu.
'Quando meu filho parou de respirar na UTI do hospital, tentaram reanimá-lo, mas o equipamento usado para isso estava quebrado. Providenciaram outro, mas quando ele chegou já era tarde', disse Flávio Dino.
O silêncio do governador do Distrito pode ter sido o silêncio cauteloso, respeitoso, reverencial e até solidário em relação a um pai desesperado,
desolado, a quem nada e ninguém poderiam consolar num momento como aquele.
Mas o silêncio do governador também pode ter representado o silêncio dos cúmplices, dos que nada têm a dizer porque nada fazem - ou fazem mal, muito mal - quando setores essenciais, vitais, letais da administração pública
enveredam pelo caminho tortuoso da imprevidência e de gestões inadequadas.
O silêncio do governador do Distrito Federal pode ter sido do tipo dos que ensejam o grito, o clamor de revolta de milhares, milhões de pessoas desamparadas, que madrugam nas filas intermináveis do SUS, à procura de socorro que muitas vezes não é prestado na hora porque não existe sequer um pedaço de gaze para cobrir um ferimento.
O silêncio do governador pode ter o mesmo sentido do silêncio de tantos governantes que não têm a dimensão exata do que se passa nos porões de sua administração porque nunca tiveram - e felizmente não tiveram - um filho,
um familiar ou um amigo morto nas mesmas circunstâncias em que morreu o filho do presidente da Embratur.
O silêncio do governador deve ter como contraponto a vigilância, as cobranças, as pressões, o maior empenho de toda a sociedade, para cobrar permanentemente a adoção de políticas públicas que garantam a todos, independentemente de condição social, o atendimento digno, humano e eficaz no setor de Saúde pública.
Fonte: O Liberal
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