quarta-feira, 26 de outubro de 2011

A HISTÓRIA E A REPRESENTAÇÃO DO REAL


Heródoto e Tito Lívio dedicaram-se a contar a história de seu tempo, mas, é possível existir imparcialidade no registro dos fatos? Para Flavia Maria Schlee Eyler, professora de História Antiga e Medieval na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), não é da condição humana ser imparcial.

“Existe sempre uma interpretação. História não é ciência exata, ela fala sobre o que passou, torna presente a ausência. Por isso, há sempre uma variabilidade de pensamento”, explica.

De acordo com Claudia Beltrão, professora de História Antiga da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Tito Lívio sabia – e deixou isso muito claro – que apresentava uma versão, uma interpretação de coisas passadas, a partir de outros textos, tradições orais, mitos, lendas, e objetos que lhe chegaram do passado.

“Tito Lívio abre o Livro I de 'Ab Urbe condita libri' (Desde a Fundação da Cidade), de um modo cuidadoso, dizendo que tratará de coisas que ocorreram há mais de 700 anos de sua própria época. Eis uma das (muitas) coisas que temos de levar em conta: ao escrevermos a história, é preciso prestar atenção à distância temporal – e à, espacial, social, religiosa e a outras distâncias – , para não pensarmos que os outros pensam, sentem, agem ou são como nós mesmos”, ressalta.

Segundo a professora, historiadores e outros profissionais da área de humanidades, criam, em suas narrativas, “efeitos do real”, uma vez que todo e qualquer documento per se (por si mesmo) é privado de significação.

“O objeto de conhecimento da história é o mundo das relações humanas e, em sociedade, os seres humanos sentem, pensam, agem, ponderam, emitem juízos de valor, argumentam, persuadem e são persuadidos. O texto historiográfico, em vez de descritivo, é interpretativo; em vez de reportar, informar, ele pretende analisar e interpretar, buscando o sentido do que ocorreu e ocorre com e entre os grupos humanos. O discurso historiográfico tem, desde sua origem, se esforçado por manter uma relação entre sua criação literária e os documentos, buscando as factae (as ‘coisas feitas’, e era assim que os romanos definiam o objeto de interesse da História) a partir de seus vestígios. Aí reside a freqüente releitura da História e das obras de historiografia, especialmente as clássicas, posto que possuíam uma preocupação explícita com a questão da narrativa e das representações, tendo-se sempre em mente que os historiadores não se destinam a descrever o real, mas sim a representá-lo”, completa.

Claudia Beltrão é professora de História Antiga e Medieval na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)
Fonte: G1

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